quinta-feira, 30 de setembro de 2010

O conto dos solitários

Foi quando o dia parou antes mesmo de eu perceber. Acordei sob um chão de vidros quebrados, cujos reflexos mostravam claramente o sangue vermelho-vinho dos meus profundos cortes. Profundos mesmo, além dos cortes, é essa minha inestimável dor de vagar por aí sem ter lugar para ir. E, mais ainda, sofrer nessa minha ensanguentada solidão, sem que ninguém me veja, sem que ninguém me sinta. Talvez se existisse algum jardim completamente florido nesse imenso bosque de árvores, pudesse haver algum forçado sorriso amarelo em meu semblante. Ando nesse bosque e tenho sempre a mesma sensação de todos os dias: andar nas nuvens sem saber o que vem depois de cada nuvem nesse longo percurso de céu a céu. E, de tanto andar, eis que encontro lírios. O mesmo anuncia: HÁ ALGUÉM AQUI! Olho perturbadamente para trás, para frente, para um lado e para outro: não há absolutamente nada. Continuo andando nessa caminhada sem fim, a espera de algum sentido que me faça creer mais uma vez. Nunca encontro nada. Dessa vez, até as árvores desapareceram. O azul do céu se tornou um cinza completamente horripilante. Eu parti. Dizem que quando não se tem ninguém para mostrar a realidade, começamos a acreditar nas fantasias. Acordei.