terça-feira, 18 de novembro de 2014

Astronauta de mármore

E rabisco tantas outras coisas em diversos pedaços de papel atirados pela casa. Rabisco na tentativa de - por um acaso - conseguir esboçar um desenho que soe perfeito diante dos teus olhos. Mas cada esboço reflete cada vez mais as minhas imperfeições. E cada imperfeição eu desloco o teu olhar de mim.

Não nego o meu medo - o mundo não é perfeito, eu sei - mas queria, de coração, conseguir te fazer enxergar que as minhas imperfeições fazem parte desse mundo, e não do nosso universo paralelo. Mas tudo bem. O que me ocorre, de fato, é não conseguir entender que me falta sabedoria para lidar com os dias, entende? Que, talvez, o simples fato de não saber lidar, por si só, já é uma imperfeição. E me questiono sobre a real ideia de perfeição que as escolhas que fazemos nos permitem discutir. Sobre o que nos move a sermos perfeitos - de fato - para contemplar o olhar do outro.


Queria contar-te que, de todas as coisas que tenho escrito, meus rabiscos soam tortos quando comparados com os teus. Porque não consigo exteriorizar o que se encontra sólido e intocável dentro de mim. Porque, na maioria das vezes, questiono minhas vulnerabilidades sobre falar do que sinto - e me aperta o coração não conseguir dizer o tanto que te quero, aqui, por escrito, em extenso e sem abreviaturas, no belo e bom português.

Tenho, aos poucos, retomado o ritmo. Escrevo algumas coisas, depois apago, retomo em outros contextos, faço conexões desleais com a coesão textual, mas tudo porque na minha cabeça tem uma poção de coisas para serem faladas e desabafadas, que qualquer movimento brusco que se assemelhe a um rabisco me faz perder a noção das ideias e a confundir todos os meus escritos com simples pedaços de papel.

É o que a vida faz - uma vez me disseram. Respondo que não! É o que viver faz. Ando vivendo muito e escrito um pouco menos. Orbitando em cosmos diferentes, a cada segundo, na dimensão que o universo me permite ser. Sou eu, agora, pedindo emergência. Esvairada na comoção das beiras e das marés. Colidindo com mil e uma palavras presas debaixo da minha língua. Sou eu, agora, pedindo para parar.

Pare, mundo! Quero pousar. 

He enloquecido dulcemente

O quanto se esquiva uma alma cheia de segredos? O que se faz presente, que desperta o desejo, no desconhecido? Parece-me que, vez em quando, a alma disfarça e camufla os sentimentos. Seria por que estes se confundem, transloucados, na imensidão do universo? 

Que dizer eu, que já amei tantas vezes. Que me fugia das mãos e apertava o coração como um soco em queda livre. Que encontrava, na bifurcação dos meus passos, um desnorteio qualquer e, ainda, semeava diante das bravuras dos dias, um só dia que me fizesse feliz.

Hoje entendo. Diante da escuridão, qualquer luz que se vê é vida. E qualquer coisa que se aviva diante dos meus olhos eu já amo. E entendo que o que aviva as pessoas, as coisas, os dias, não são o efeito biológico do que se entende por vida, mas sim a luz com que os olhares se guiam, avistando o desconhecido, mergulhando num mar de conexões abstratas.

O coração sente o que a alma exterioriza. A alma sente quando o pulso se torna forte, os olhos se amolam quando o despertar do desconhecido se torna forte e o desconhecido já não é mais desconhecido - é algo que se encontra dentro dos teus dias, das tuas horas, dos teus sonos. Algo que se move, se aloca e te transborda. Algo que não está só mais beirando, mas sim fazendo parte das tuas ondas e dos teus movimentos de situações-perplexas-que-merecem-ser-entendidas-como-algo-doce. 

E enlouquece docemente. Através da penumbra que o coração se encontrava, semeando o desconhecido e se entregando de corpo e alma lavadas. Hoje eu entendo.


segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Maré Viva

sempre que avisto a escuridão
meu amor, teus olhos brilham
e sempre brilharão;

e nos destemidos encontro meu eixo
me foge da compreensão
qualquer palavra que semeio;

e me vou, num par de moléculas
constatar o que o universo explode:
eu sou
a-mar-é
todos somos
só não é, quem não se aviva.
Outro nó. Dessa vez, mais amarrado. Se remendou toda. Mergulhou fundo. Cheque-mate, meu bem. Na melhor das hipóteses, não há outro caminho a seguir, se não o nosso. A cada trilha que eu faço, meu rastejo tu encontras. E encontras as minhas pegadas e as minhas marcas e o meu suor e todo o meu amor. E me reencontras e reconhece. Autocuida. Não se esquiva. Se desloca pra frente e pra trás: gira e samba em torno de mim. E dos sambas mais bonitos, eis que encontro o som da tua voz. 

Alguma vez na vida, será que eu soube que eu deveria estar aqui?

Que ves y sentes cuando te ves?

Tenho escrito textos longos, árduos, com palavras breves e conexões sem sentido algum. Tenho tido dificuldade em transcrevê-los - digo, tirar da cabeça e colocar pro papel o que eu vejo na cidade, nas árvores, nos cachorros, na velha sentada em frente à sua casa num final de tarde qualquer. E me remete que de repente me falte palavras no meio de tantas sensações diferentes. É como a onda que vai e volta no mar, mas eu sou um peixe e sair do meu ambiente natural seria como cavar o meu próprio enterro. Porque me falta ar quando deixo de ser o que sou. E só o sou porque sei que amanhã terá um sol lá fora para brilhar e iluminar as minhas bifurcações constantes. 

E a vida se modifica ao meu redor. Um passo à frente é sempre um passo para trás. E eu corro para alcançar as estrelas que se deslocam como feixes de luzes. E como um torpedo flutuo na minha sincera e humilde sensação de ser feliz. E o sou. Sigo em constante enlouquecimento, o que me é estranho. Mas é uma loucura doce - que eu abraço, inclusive. Aliás, estranho mesmo é ser feliz e não saber, só entender. Não justificar, só viver. Não temer, se encorajar. Não chorar, sorrir - feliz da vida. O Feliz, da Vida. Aquele, lembra?