sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

Eu me viro bem sem você

Tenho tido dias bons. Eu me viro bem sem você. Exceto quando os dias são chuvosos e os trovões parecem corroer os meus ouvidos ao se misturarem com os infindáveis ecos da tua voz. Exceto quando cruzo por aquela rua que a gente já batizou com nossos desejos e sonhos. Exceto quando qualquer gesto bom que eu faça a qualquer estranho me lembre dos gestos bons que eu fazia por quem eu amara. Eu tenho me virado entre uma cerveja e outra, alguns amigos novos e algumas viagens loucas. Eu só não tenho me virado bem quando os dias findam e com eles se vão mais umas horas da minha vida em que eu senti a tua falta em tudo que eu fazia. Eu tenho me virado bem, exceto quando qualquer outro olhar me lembre o teu, qualquer outro cheiro me lembre o teu perfume da pele, qualquer outra casa me lembre o que um dia foi só nosso. Eu tenho me virado bem, exceto quando eu me angustio com as tuas escolhas que eu não teria feito, com as tuas mágoas que eu não teria guardado, com as tuas andanças em outras bocas e olhares que eu não teria sequer desejado se estivéssemos lado a lado. Eu tenho me virado bem. Difícil vai ser retornar ao mundo oposto do que eu vivo aqui daqui há um mês e perceber que, desta vez, eu realmente precisarei me virar, revirar e reinventar, só que sozinha.

I Get Along Without You Very Well

Renato Russo


terça-feira, 18 de dezembro de 2018

Rehab

Eu só queria passar por aquela porta que dizem ter luz do outro lado, sabe? Queria encontrar um rumo pro meu coração ferrado, que cessasse a dor do rompimento, que bifurcasse cada veia e cada artéria, milimetricamente calculado, para fora do meu corpo - esse corpo que tão meu que és, se arrepende amargamente de um dia ter sido tocado com gestos tão descontentes e agonizantes de amor. Esse corpo que hoje exala o enxofre e o odor mais podre já visto antes, porque apodreceu aquilo que deveria ter sido o farol mais bonito de encontro das luzes com as águas. Hoje me pego pensando que dói demais não saber dos meus dias, mas que dói mais ainda não conseguir me ver nos próximos dias em pé. Eu tenho andado de bar em bar, remoendo e gastando o pouco que me resta em vida, pra ver se em algum lugar eu encontro o infinito. Eu tenho buscado pela paz do meu espírito e da minha mente, mas se me pego sozinha, percebo que não tenho mais a mim, que não tenho mais quem eu fui. Para onde eu deveria correr? Que asfalto imaginário eu deveria caminhar? Quem foi que me fez assim?

sexta-feira, 7 de dezembro de 2018

Corpo, mente e espírito

Eu corri pra longe porque eu não vi mais o sol, o chão, a lua. Eu via a tempestade da janela do meu quarto anunciar a renúncia a tudo aquilo que me corroeu e me fez sofrer. Eu percebi que eu tinha pouco tempo pra sobreviver. Eu precisava correr - rápido, veloz, intenso. No meio dessa corrida eu deixei tudo que eu amava pra trás. Deixei a parte mais bonita da minha vida amortecida após longos anos permanecendo em queda livre. Eu tive que correr, compreende? Eu corri pra longe pra tentar mudar. Talvez a dor passe se a gente parar de cavocar a ferida - foi o que pensei. Mas entendo que cada dia será uma construção mental e espiritual de elevação. E eu tenho vontade de me elevar. Eu corri pra longe e eu não trouxe nada comigo. Estar aqui em corpo, mente e espírito é o que me faz continuar.

segunda-feira, 19 de novembro de 2018

Texto antigo, pra te ler em voz alta

A literatura dos meus dias tem me corroído entre o dormir e o acordar. Quando percebo que a ferida que me bloqueia de pensar e agir infeccionou, me sento ao relento do sol e tento cicatrizar com outras feridas. As escoriações já não doem mais. São tantas marcas que, com o tempo e um trabalho mental árduo, se desfazem na medida em que os dias pesam e as palavras já não são mais ditas. Talvez não caiba a mim encontrar as respostas. Talvez eu devesse intermediar perguntas e aguentar o tranco com as minhas bebedeiras matinais. A necessidade é outra: sofro da falta de escrita. O coração vai bem. Mas é como se eu fosse um cano e tivessem tapado ambas as extremidades e me deixado ali, imersa, com água ou esgoto ou o que for. Sem respiração, apenas mantendo a calma e a sanidade - um dia me encontrarão - repito todos os dias. Mas não encontraram.

Vejo as palavras fugirem nas esquinas, me mantendo asfixiada com meus sentimentos, e ninguém percebe o quão em apuros me perco. Espalho as minhas desordens nas desordens dos outros e desoriento quem surge para me orientar. Que coisa, não? Passar os dias me remoendo, sem ninguém para falar.

quinta-feira, 18 de outubro de 2018

Poçal

Ouvi a porta tocar. Atendi o interfone. -Encomenda da internet para Fernanda - disse o motoboy. Achei que fosse de você pra mim. "Eu não encomendei nada", pensei, surpresa, mas feliz. A minha encomenda do mercado livre chegou mais cedo. Fiquei triste. Achei que fosse mais uma das tuas surpresas quietas, daquelas que eu não desconfiaria de forma alguma. Não era. Era só o meu anseio relutando em acreditar que ainda exista algo para eu esperar de ti e de nós. Não existe mais.

O que temos pro café da manhã? Um pão, talvez um café passado, ou meu coração num prato bonito qualquer?

Sai e fui tomar uma cerveja num bar. Não era um bar qualquer. É daqueles pertinho de casa, que a cerveja é gelada e tem cinzeiro. Estava chuviscando. Sentei na mesa de fora, mesmo assim, pois precisava de um cigarro também. Depois do meu flagra poçal que dei em mim, não havia o que eu não precisasse de consolo. A moça do bar perguntou "Dois copos?". Sofri com esse questionamento. Respirei fundo e me recordei que possivelmente ouvirei isso em todos os lugares que fomos. Não, apenas um - respondi.

Será que os barulhos dos carros refletem o teu barulho chegando a mim? Escuto teus sons.

Antes disso tudo eu estava em casa, afogando minha dor limpando qualquer coisa que eu visse pela frente. Ouvi o barulho das tuas chaves, mas não era você. Ouvi o barulho dos teus sapatos, também não era você. Por que ainda me pego, depois de tudo, depois de todos os meus pensamentos positivos de que conseguirei seguir em frente, por que me pego pensando nisso?

Pedi outra cerveja. Confesso que com uma eu já fico palpitante. Ainda chuvisca em mim. Sentei debaixo de uma árvore e foi quando eu me vi sentada nas margens do rio Piedra, sabe? Aquele rio que eu sentei e chorei - em outra ocasião que não cabe a mim explicar, mas sim Paulo Coelho. É daqueles livros que eu insisti em ler até o código do bibliotecário. Porque sim, eu sentei e chorei. E queria ter me visto nessa cena, num bar qualquer, sem ninguém ao meu redor, chuviscando - literalmente - pelos olhos.

Hoje eu escrevo sobre como lidar com sentimentos de ansiedade. Escrevo sobre como sobreviver ao caos alienígena e intolerante. Escrevo sobre a dor da ausência (ou da onipresença?). Escrevo sobre me sentir viva, ao passo em que algo em mim morre cada dia mais. Eu sou a minha própria maré. E estou abaixando.

sábado, 13 de outubro de 2018

Não me sinto mais

Eu não me sinto mais em casa. E é tão estranho se desvincular assim de algo que parecia, tão singelamente, te pertencer. A verdade nua crua é que nada nos pertence até que percebamos que estamos no zero absoluto de sentir algo que não seja a dor. Estamos tão sugestivos a perda quanto qualquer outro elemento atmosférico que precisa se perder para que, de fato, se encontre. A verdade é que eu, verdadeiramente, não me sinto mais em casa - não me sinto pertencer e é como se eu nunca estivesse de fato aqui. É como se algumas coisas nós devamos sentir de leve, sem esforço, enquanto outras nos são empurradas goela abaixo. Sinto-me vazia. E o vazio é o que cruzou goela abaixo desta vez.

domingo, 30 de setembro de 2018

Carta para se despedir de novo

Passa um filme na minha cabeça toda vez que penso em ir. Como se fosse muito além das histórias que temos para contar. Como se fosse uma imensidão de sentimentos que borbulham em minha cabeça e, por vezes, me fazem vomitar os meus cacos, pisar neles e sangrar até a morte. Com quantos panos se estanca o sangue que insiste em não parar de sair? Com quantas gazes a gente tapa uma ferida?

Eu andava na cidade procurando - bem, eu não sei bem o que eu estava procurando. Mas tentava me encontrar no muro pichado que cheirava a militância, nas músicas dos barzinhos que cheiravam a festa, na comida tailandesa que a gente queria provar. Eu juro que estava tentando me encaixar. Mas até que ponto sou eu quem estou totalmente errada? Até que ponto eu sou a peça que precisava ser trocada pelo SAC? E se eu estiver ficando louca?

Hoje, em ritmo de despedida, eu vou guardando cada coisa minha atirada pela casa. Vou juntando tudo o que eu vou levar e me despedir daquilo que eu tenho que deixar. Que triste, né? Não caber mais no corpo de alguém. Não se sentir mais segura. Não sentir a incrível sensação do que é ser feliz. Não saber mais o que é acordar no outro dia sem se preocupar com as coisas da casa, porque a gente estava mais preocupadas em viver. Eu tinha tantas coisas pra te escrever agora, mas eu não sei se tu ainda lembras do cantinho que eu tenho para me debruçar e chorar. Não sei se lembras que eu ainda estou aqui hoje.

Ontem eu ouvi que a decisão a ser tomada seria para sempre. Então, te digo que eu a amo para sempre. Porque se for pra existirmos, que seja nas coisas que não tivemos tempo de viver, apenas de imaginar.

Eu nem sei se você vai ler,  mas se ler saiba que foi real.
Forever Ago.

domingo, 11 de fevereiro de 2018

Já foi, hoje?

Já foi amor. Hoje é luta. Luta para ficar, luta para sair. Luta para não chorar. Luta para sentir. Hoje é caos estagnado no centrão. É perder o foco. É miopia. Cada dia é uma coisa. Já foi um pouquinho mais hoje? Hoje é dor, antes de qualquer coisa. É uma barra perfurando os teus pulmões. É a falta de sensibilidade. Já foi amor. Hoje é droga. É a junção das nossas pupilas aterrorizadas. Hoje é qualquer música tocada na 102.30 sendo lembrada como antiga. O nosso amor é old. É inglês não bem certo. É português estourando de gírias. É bolado. É desordem. É vertigem. É faca na bota. É trovoa, underneath the stars e closer. É ele. E hoje, já foi? Será que você já foi?