Acordei. Acordei e olhei ao redor para ver se eu ainda estava deitada
na mesma cama. Me remete momentaneamente na cabeça cenas desfocadas de
libélulas e luz, muita luz. E em outros instantes eu vejo essa mesma luz
se desorientar e expandir na escuridão em inúmeros e pequenos feixes. A
vida corre e a intensidade da expressão em que me refugio dormindo
também some. Durmo.
Dizem por aí que os sonhos são sempre nossos maiores bens, que
devemos nos agarrar em cada um deles como se fosse nossa última
alternativa de sermos, por fim, felizes. Eu tenho todos os sonhos do
mundo também, Fernando. E tenho todos eles enlaçados entre os dedos. Às
vezes sinto que eles escorregam das minhas mãos, mas são instantes tão
breves que nem se quer me preocupo – o que é meu, por direito, sempre
volta.
Acordo. Ouço os relâmpagos da tempestade que devasta tudo o que a
cerca. Desta vez apalpo a cama para ver se ainda estou deitada nela.
Estou e a tempestade é dentro de mim. O mais errado disso tudo não é o
fato de eu ter acordado e finalmente percebido que a chuvara com a qual
eu tanto me acanhava era dentro de mim, mas sim por saber que talvez o
arco íris demore para chegar e que, sem querer, a chuva não molha só o
meu corpo. Durmo.
Os sonhos são pesadelos que deram errado. Porque na verdade a vida
não passa disso: sonhos que deveriam ser pesadelos, mas no ato não o
são. Nem aqui, nem aí. Tu não enxergas. Os sonhos são mutáveis, piores
que o hiv atuando na corrente sanguínea. Patologicamente falando: não
morremos de AIDS, morremos de doenças oportunistas. Resumindo: não
morremos de amor, morremos de outros sentimentos oportunistas.
Acordo e durmo. E sigo assim, até que os sonhos dos quais eu tanto
prezo tenham realmente alguma direção definida, com horário e local de
chegada e partida.
Não subestima teus sonhos, rapaz. Mesmo que a gente não encontre
razões para que eles continuem vivos. Sonha mais, cada vez mais. Porque o
sonho é um sentimento oportunista e antes morrer por um sonho do que
por amor.
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